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O carro elétrico vai salvar o planeta...?




Ninguém hoje estava vivo para se lembrar, mas quem morava nas cidades do final do século XIX e começo do século XX já sofria para ir e vir. Congestionamentos de charretes e carruagens em vias estreitas, transporte público inexistente ou ineficiente. E um elemento inimaginado nos dias de hoje, poluição por fezes e urina de cavalo, além de cavalos mortos esperando serem coletados.


Surgiu no entanto uma tecnologia limpa e eficiente perfeita para resolver a poluição gerada pelos transportes movidos a tração animal. As carruagens movidas por um motor a combustão aos poucos ganharam espaço urbano. Mas foi depois que Henry Ford revolucionou o método de produção desses carros sem cavalos, que as ruas das cidades nunca mais foram as mesmas e o século XX acabou por tornar-se o século do automóvel.


Mais de cem anos depois, o planeta está sufocado por uma frota de cerca de 1,3 bilhão de motorizados que cresce a uma taxa de cerca de 100 milhões de novos carros e veículos comerciais produzidos anualmente. Uma média de 182 à explosão para cada 1.000 almas neste planeta. Com números bem piores nos países ricos ou até mesmo nas grandes cidades brasileiras.


As consequências da proliferação dos motores à combustão são sentidas todos os dias nas perdas econômicas por conta dos congestionamentos, na poluição do ar, nas mortes no trânsito e também no aquecimento do planeta por conta do CO2 que sai dos escapamentos.


O renascimento do motor elétrico para automóveis concentrou seu foco majoritariamente nos gases que saem dos canos de descarga. Mas como toda solução tecnológica, desconsiderou diversas outras questões.


Um futuro urbano que seja saudável para o planeta precisa estar centrado nas pessoas, tal como estabelecido na metodologia A-S-I de Evitar-Mudar-Melhorar. Dentro dessa tríade, motores elétricos em novos automóveis inverte a ordem de prioridades, acaba por priorizar uma solução tecnológica complexa, com diversos impactos não previstos e omissões, em detrimento de alternativas mais simples.


Nossas cidades precisam de soluções simples, eficientes e inclusivas. Centradas no fortalecimento de comunidades locais e capazes de reduzir emissões. Em outras palavras, justiça climática que enfrente nossos desafios na rua, longe dos gabinetes com ar condicionado.


Carros elétricos reduzem mesmo as emissões de gases de efeito estufa?


Uma comparação justa de impactos entre veículos elétricos e convencionais precisa começar da fabricação. O Instituto Fraunhofer de Física de Construção aponta que os carros elétricos geram o dobro das emissões de gases de efeito estufa na sua fabricação.


A responsabilidade por esse impacto 100% maior são as baterias. Para cada kW/h de capacidade, são emitidos 125 quilos de CO2. Com isso, as baterias de um carro puramente elétrico, com 22 kW/h de capacidade, emitem quase 3 toneladas apenas para serem fabricadas.


A origem da energia que recarrega as baterias é outro impacto das emissões dos carros elétricos que raramente é computado. Em 2011, o Instituto de Pesquisa de Energia e Meio Ambiente (Ifeu) aponta que, utilizando o mix de energia normal da Alemanha, um carro elétrico levaria cerca de 100 mil quilômetros até neutralizar suas emissões de fabricação.


Com recargas de fontes renováveis, os impactos climáticos seriam zerados após 30 mil quilômetros, um número ainda bastante alto. Considerando estimativas que apontam a vida útil de um automóvel de cerca de 11 anos e aproximadamente 140 mil quilômetros (nos Estados Unidos), a revolução climática do carro elétrico é diretamente dependente de fontes de energia 100% renováveis para ter impacto nas emissões.


Há fumaça por trás dos veículos de “zero emissões”


Políticas públicas e campanhas publicitárias que incentivem o uso de veículos elétricos “em benefício do meio ambiente” ou como estratégia de mitigação de emissões pelo setor de transporte podem acabar provocando efeitos extremamente prejudiciais para as cidades e o planeta. Afinal, o carro elétrico como veículo de “emissão zero” desconsidera todas as emissões indiretas em sua fabricação, uso e posterior descarte.


Uma consequência bem direta de incentivar mais pessoas a optarem por carros elétricos já pode ser sentida na Noruega, país campeão na eletrificação de sua frota particular. Mais gente acabou por dirigir mais e com isso diminuiu em 80% o uso do transporte público, com as consequências negativas dessa mudança de modal.


O futuro do automóvel é elétrico, provavelmente autônomo. Mas seu protagonismo nas ruas e estradas do planeta precisa ser discutido. A nova tecnologia que representam certamente irá dominar o mercado, mas as políticas públicas precisam estar centradas em soluções mais simples e eficientes. Do contrário, estarão privilegiando os interesses das empresas automobilísticas em detrimento da sociedade como um todo.


 

Referências:


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